SUPONHAMOS
Vamos supor, por exemplo,
Um sol que estes céus fendia
E se oferecia em calor,
E que em nós dois se acendia
Uma chama de alegria
Em cada gesto de amor,
Trocado no nosso templo.
Vamos supor, por exemplo...
Por exemplo, suponhamos,
Um arco-íris no ar,
Um riso de vagabundo.
Que conseguimos achar,
Um jeito de festejar,
Em cada simples segundo,
O muito que nos amamos.
Por exemplo, suponhamos...
Um sol que estes céus fendia
E se oferecia em calor,
E que em nós dois se acendia
Uma chama de alegria
Em cada gesto de amor,
Trocado no nosso templo.
Vamos supor, por exemplo...
Por exemplo, suponhamos,
Um arco-íris no ar,
Um riso de vagabundo.
Que conseguimos achar,
Um jeito de festejar,
Em cada simples segundo,
O muito que nos amamos.
Por exemplo, suponhamos...
Ponta Delgada, 2010-05-07
LET'S SUPPOSE
Let us suppose, for example,
A sun that splits these skies
And offers itself in heat,
And that light's up in the two of us
A flame of joy
In every gesture of love,
Shared in our temple.
Let's suppose, for example ...
For example, let's suppose,
A rainbow in the air,
A tramp laugh.
What we could find,
A way of celebrating,
In every single second,
How much we love each other.
For example, let's suppose ...
Ponta Delgada, 2010-05-07
_____________________________________
SEI DUM POEMA
Eu sei dum poema louco
Nascido dum grito rouco,
Que por pouco
Se calou.
Nascido dum grito rouco,
Que por pouco
Se calou.
Também dum poema pomba,
Alva, branca. De mim zomba.
Sonho-bomba
Que estourou.
Alva, branca. De mim zomba.
Sonho-bomba
Que estourou.
Sei do poema indigente,
Tingido de inteligente.
Do demente
Que alucina.
Tingido de inteligente.
Do demente
Que alucina.
Do poema que não diz,
De feiticeiro aprendiz,
Meretriz,
E concubina.
De feiticeiro aprendiz,
Meretriz,
E concubina.
Sei do poema matreiro,
Velado, mas verdadeiro,
Sorrateiro,
Que desperta.
Amo o poema, que arrasaVelado, mas verdadeiro,
Sorrateiro,
Que desperta.
Vento, fúria que extravasa,
Golpe de asa,
Que liberta!
I KNOW ABOUT A POEM
I know about a crazy poem
Born of a hoarse cry,
So narrow
To shut up.
I know also about a dove poem,
White. It mocks me.
A dream bomb
That burst.
I know about the indigent poem,
Dyed smart.
Demented
That hallucinates.
And about the poem that does not say,
As an apprentice sorcerer,
Whore,
And concubine.
I know the sly poem,
Veiled, but true,
Sneaky,
That awakens.
I love the poem, which devastates
Windy, furious that overflows,
Wing blow,
What sets you free!
Aníbal Raposo
Relva, 2012-11-23
_____________________________________________
ONDE CAÇAR VERSOS
No musgo do tronco duma velha árvore;
Na manhã radiante dum sorriso breve;
Num abraço rubro, sol na tua face;
No verde de esperança das folhas dum trevo;
Na manhã radiante dum sorriso breve;
Num abraço rubro, sol na tua face;
No verde de esperança das folhas dum trevo;
Nas nuvens de vento que riscam os
céus;
No vermelho chama da cor dos teus lábios;
Nos olhos escuros da moira encantada;
Nas tocas de coelho com palavras quentes;
No vermelho chama da cor dos teus lábios;
Nos olhos escuros da moira encantada;
Nas tocas de coelho com palavras quentes;
Na força medonha das ondas do mar;
Nos jornais que vestem os seres sem abrigo;
Na alegria à solta em cada criança;
No jeito dum pisco de peito laranja;
No espelho de água junto da nascente;
Numa mão sincera que nos é estendida;
Nos jornais que vestem os seres sem abrigo;
Na alegria à solta em cada criança;
No jeito dum pisco de peito laranja;
No espelho de água junto da nascente;
Numa mão sincera que nos é estendida;
No amor ao outro, sentido e profundo;
No botão da rosa janela do mundo.
No botão da rosa janela do mundo.
Relva, 2015-05-29
Aníbal Raposo
Aníbal Raposo
_________________________________________
A ÚLTIMA NOITE
Quando te fizeste à estrada
Naquela noite tão comprida
Estavas longe de entender
Que ela seria
A última noite
Da tua vida
Lá dentro do bar
Entre copos e folguedos
Tinhas bebido o fel da desilusão
A menina dos teus olhos, tua amada
Decidira por fim
Dar a outro a sua mão
Era mais do que podias aguentar
Foi uma faca que te rasgou o coração
Cada palavra era uma teia de embaraços
Cada sorriso era assim como um açoite
E com a alma já desfeita em mil pedaços
Decidiste mergulhar na noite
Rola-te uma lágrima pela cara abaixo
Deixa-te na boca um gosto a sal
Tens a visão já um pouco embaciada
Doi-te a cabeça
Sentes-te mal
Os faróis dos carros parecem fogos
fátuos
Assim como clarões no nevoeiro
O teu orgulho está feito num farrapo
Sentes contra ti
O mundo inteiro
É então que resolves começar a abrir
Ao menos na estrada serás o primeiro
Agora sim tu és o rei da noite
Voas na vertigem da velocidade ...
(Ouviu-se um baque surdo e nem te deste
conta
Que abrias uma porta
Na eternidade)
THE LAST NIGHT
When you hit the road
in that long night
You were far from understanding
That it would be
The last night
Of your life
Inside the bar
Between glasses and revels
You had drunk the gall of disappointment
The apple of your eyes, your beloved
Had finally decided
Give her hand to another guy
It was more than you could handle
It was a knife that riped your heart.
Every word was a web of embarrassment.
Every smile was like a whip
And with the soul already undone in a thousand pieces
You decided to dive into the night.
A tear rools down in your face
And leave a taste of salt in your mouth
Your vision is already a little foggy
You have a head ache
You feel bad
The headlights of the cars look like lights of illusions
Like flashes in the fog
Your pride is like a rag
You feel that the whole world
is against you.
Than you resolve to drive quicker
At least on the road you'll be the first
Now you are the king of the night!
You fly in the vertigo of speed ...
(A thd was heard and you did not even notice
That you were opening a door
in eternity)
___________________________
POEMA PARA O MEU AMOR
Há voos de pássaros nos teus olhos castanhos de sereia
Batuques africanos no balouçar do teu corpo de gazela
Há frutos maduros na tumidez dos teus pequenos seios
E promessas loucas na humidade dos teus lábios entreabertos
Há como um tango argentino no desafio da tua cintura estreita
Há um doce encanto no urdir das tuas trancinhas de menina
Há estranhos sortilégios escondidos em tuas mãos de fada
E há rouxinóis magoados de cada vez que cantas
Há ondas de ternura neste teu jeito suave
E danças peruanas nas tuas ancas pela alba
Há calor dos trópicos no aperto dos teus braços tão sinceros
E uma paz das ilhas no teu macio leito de princesa
Há druidas, de novo, preparando filtros à sombra de carvalhos
E lagos privados onde nadam altivos cisnes brancos
E há luas de fajãs que riscam no mar trilhos de prata
E nascentes de água que brotam do teu riso cristalino.
Aníbal Raposo
Maré de Agosto de 2003
Dia 22
Santa Maria
Há voos de pássaros nos teus olhos castanhos de sereia
Batuques africanos no balouçar do teu corpo de gazela
Há frutos maduros na tumidez dos teus pequenos seios
E promessas loucas na humidade dos teus lábios entreabertos
Há como um tango argentino no desafio da tua cintura estreita
Há um doce encanto no urdir das tuas trancinhas de menina
Há estranhos sortilégios escondidos em tuas mãos de fada
E há rouxinóis magoados de cada vez que cantas
Há ondas de ternura neste teu jeito suave
E danças peruanas nas tuas ancas pela alba
Há calor dos trópicos no aperto dos teus braços tão sinceros
E uma paz das ilhas no teu macio leito de princesa
Há druidas, de novo, preparando filtros à sombra de carvalhos
E lagos privados onde nadam altivos cisnes brancos
E há luas de fajãs que riscam no mar trilhos de prata
E nascentes de água que brotam do teu riso cristalino.
Aníbal Raposo
Maré de Agosto de 2003
Dia 22
Santa Maria
POEM FOR MY LOVE
There are flights of birds in your brown mermaid eyes.
African batuques in the swing of your gazelle body
There are ripe fruits in the softness of your little breasts
And crazy promises in the dampness of your parted lips
There's like an Argentinean tango in the challenge of your narrow waistline
There is a sweet charm in the weaving of your little girl braids
There are strange spells hiding in your fairy hands
And there are nightingales hurt every time you sing
There are waves of tenderness in this gentle way.
And Peruvian dances in your hips at dawn
There is heat of the tropics in the grip of your arms so sincere
And a peace of the islands on your soft princess bed
There are druids again, preparing filters in the shade of oaks
And private lakes where haughty white swans swim
And there are moons of fajãs that scratch in the sea silver rails
And water springs that sprout from your crystalline laughter.
_________________________________________
INVERNO
Três anjinhos brancos a nadar no inferno
Dizem-me que hoje começa o inverno.
Um dia maior só por ser tão curto
Num país de escolas da arte do furto.
Há carniça fresca e abutres em luta
E um galo de fraque servindo sicuta.
Em Belém há casas bem mal frequentadas
O demo é solista de missas cantadas.
Paciências chinas num infindo advento
Rios tão educados no seu movimento.
Se a porca já guincha vem aí matança
Um servil mordomo é o mestre da dança.
Numa mãe ditosa feita meretriz
Um robô biónico fala mas não diz.
Um eterno seguro em equilíbrio instável
Enorme eucalipto medra em terra arável.
As velas da esperança não chegam à costa
Cospem-nos em cima e a gente gosta.
Mil e uma peças, os mesmos atores
Duas mil mentiras, três mil impostores.
Vamos erriçados em patranhas tantas...
Oh mar do capelo quando te levantas?
Relva, 2013-12-21
Aníbal Raposo
WINTER
Three white angels swimming in hell
They tell me that winter starts today.
This is a great day just for being so short
In a country plenty of schools of the art of theft.
There are fresh carrion and fighting vultures
And a morning dressed rooster serving hemlock.
In Belém there are a lot of whore houses
The devil is soloist in sung masses.
We have Chinese patience in an infinite advent
And rivers so polite in their movement.
If the sow is already squeaking, killing is on way
A servile butler is the master of the dance.
In a bliss mother made whore
A bionic robot talks but does not say anything.
An eternal secure in unstable equilibrium
A huge eucalyptus thrives on arable land.
The sails of hope do not reach the shore.
They spit on us and we like it.
A thousand and one of stage plays for the same actors
Two thousand of lies, three thousand of impostors.
We are caught up in so many fudges ...
Oh rough sea when will you arise?
_______________________________________________
UM TOLDO AMARELO
Uma cabana
Um toldo amarelo Um mar de azeite Que dá gosto vê-lo Duas gaivotas Um melro a cantar Um doce Um sereno abraço À luz do luar
Um pé de conversa
Um bater de asa Um lume aceso Um sargo na brasa Duas cantigas Boas de entoar Um sol Pintado a vermelho A morrer no mar
Relva,
2016-06-20
Aníbal Raposo ________________________________________________ |
ALVOROÇO
VOU PROTESTANDO |
|||
CONTRA OS MAUS VENTOS
|
|||
QUE OS MOMENTOS
|
|||
BONS, VÃO RAREANDO
|
|||
NA TARDE INQUIETA
|
|||
JÁ SE OUVE UM PRANTO
|
|||
NESTE RECANTO
|
|||
CHEIRA A SARJETA
|
|||
ESTAR AGITADO
|
|||
É OFÍCIO
|
|||
DE POETA
|
|||
NÃO ESTOU SOZINHO.
|
|||
EM CADA ESQUINA
|
|||
NASCE OUTRA SINA
|
|||
UM NOVO CAMINHO
|
|||
VAI-TE QUEIXUME
|
|||
VIVO O PRESENTE
|
|||
INTENSAMENTE
|
|||
QUE A VIDA É LUME
|
|||
O IMPORTANTE
|
|||
É REMAR
|
|||
CONTRA A CORRENTE
|
|||
VÃO ME APERTANDO
|
|||
NO TORNIQUETE
|
|||
SOU UM JOGUETE
|
|||
DUM VIL DESMANDO
|
|||
POR QUE RAZÃO
|
|||
NO MÊS CORRENTE
|
|||
NUM DE REPENTE
|
|||
FOGE-ME O CHÃO?
|
|||
CABEÇA ERGUIDA
|
|||
QUE ESTOU VIVO
|
|||
E QUE SOU GENTE!
RELVA, 2013-12-02 ANÍBAL RAPOSO TURMOIL I'm going to protest Against the evil winds Because the good moments Are so rare In every disturbing afternoon A mourning is already listen This beautiful resort Smells like sewage The poet job Is to be agitated I'm not alone In every corner A new fortune is born And a new path to go Go away whimper I live for the present Intensely Cause life is fire The most important Is to raw Against the current They are sqeezing me In a tourniquet I'm a plaything In a vile abuse I can't understand why In the middle of each month Suddenly I have no floor? I'll keep my head on Cause I'm alive Cause I'm people! __________________________
CONTRASTES
Se em mim procuras calma Eu sou desassossego Se queres é companhia Eu vendo solidão Se tu pretendes alma Eu cedo desapego Se buscas alegria Eu vivo em depressão Se anseias por esperança Eu sou um mar revolto Se não te interessa o joio Eu não sou trigo são Se procuras bonança Sou um cavalo solto Se careces de apoio Está fria a minha mão
Se a planura é teu sonho
Nasci desfiladeiro Se estimas água mansa Em mim tens golpe de asa Se me aspiras risonho Não tens um bom parceiro Se queres é confiança Eu sou um ferro em brasa Pensas que tenho emenda Eu não sei merecer-te Tu foges de tormentos Eu renego verdades Procura quem te entenda Que não sei perceber-te Tu não semeias ventos E eu colho tempestades Relva, 2012-10-30 Aníbal Raposo ________________________________________________________
CANTO DE AMOR E DE RAIVA
Muito padece de amor aquele que ama
A manhã dos olhos teus atiça a chama
Não me vou se Deus quiser
Sem a alegria de ver
Um enorme sol a arder
Na nossa cama
Em cada gesto teu há claridade
Em cada sorriso alvo uma saudade
Neste fogo abrasador
Sei-te bem, sei-te de cor
Voemos pois meu amor
Em liberdade
Pela barca portuguesa o povo teme
Nesse mar que se agiganta o casco geme
Não temos porto de abrigo
Ver um rumo não consigo
Nesta nau em desabrigo
Não há leme
Muito mal vai um país que os filhos
drena
Brota de novo feroz a vil gangrena
Não posso, não me demovo,
Há que fazer que de novo
Volte a ser o nosso povo
Quem ordena
Aníbal Raposo
Ponta Delgada, 2012-12-01
__________________________________________
CANTIGA DE RODA
Cavalo velho
cavalo novo
aos dois o freio
e a carroça
Menino-escola
velho na praça
a ambos sempre
a mesma roça
Basta de vida
tão repetida
A cada um
a sua idade
A vida ao homem
a morte ao lobo
Cavalo velho
cavalo novo
Em muitas coisas
coisas e loisas
viva a rainha
desigualdade
poema de Mário Dionísio (de As
solicitações e emboscadas, 1945)
música de Aníbal Raposo (2011)
RHYMED SONG
To the old horse To the new horse Give them both the brake and the cart To the scholl boy To the old man seated in the square Give them both Always the same field Say enough To a bored life Give to each one Is own age Life to the man Death to the wolf Old horse New horse In many things Things and other stuff Long live to the queen inequality ______________________________________________________________________________ SER ILHÉU Ser ilhéu é viver só No meio de muita gente De nós ninguém tenha dó Temos o mar pela frente… É viver a liberdade Em constante despedida Já ter no lenço a Saudade Antes de vir a partida Saber cantar a folia Saber benzer o quebranto E dar vivas de alegria Nas Festas do Espírito Santo Também descer às fajãs Beber da noite o luar Apreciar as manhãs E ouvir os búzios do mar Não ter certezas nenhumas Numa terra em convulsões Acordar por entre as brumas E adormecer nos vulcões Seja qual for o momento Ter calma, sermos serenos Olhar bem o firmamento E ver que somos pequenos É pôr o sonho na mira Estar em paz, mesmo na guerra Saber tanger uma Lira Numa viola da terra Aníbal Raposo 2012-08-27 ____________________________________ SETE
_____________________________________________ PERCO-ME EM TI E houve barcos A navegar Pelo mar fora Barcos sem rumo Sem mãos no leme Sem ter arrais Sulcavam ondas De salsa espuma Não tinham hora Foi navegar Por navegar Sem querer cais Velas erguidas Eretos panos Cheios de vento Parou o tempo Nascem desmaios E sons de mar É sempre bom Zarpar contigo Meu doce alento Sem faro à vista Perco-me em ti P'ra me encontrar Ponta Delgada 2011-11-26 LOSING MYSELF IN YOU There were boats Sailing away Onto the sea Boats without guidance Handless rudder Absent captains Carving the waves In a salsa spray Time since long lost It was sailing Just for sailing Never to port Sails to sky Lifted drapes Filled just with wind Time stood still Awake and fainting Sounds of the ocean Always so good Sailing with you My sweet deliverance ____________________________________________ SÓ DUAS PALAVRAS Só duas palavaras Vou deixar aqui Para te dizer Que não te esqueci Os cabelos de oiro Corpo fatigado Os olhos tão claros E o riso cansado Fico sempre a pensar Quando te beijo Se isso é só desejo Ou se haverá amor Um pouco que seja Um pouco ... Vês falo de amor E nem te conheci Mas ainda assim Vou deixar aqui Só duas palavras Para terminar Pois são só palavras Que te posso dar Aníbal Raposo 1981
Only two
words
I’m leaving
here
To tell you
I never
forgot you
The golden
hair
In weary
body
Eyes so
clear
Your tired
laughter
I can’t help
but thinking
Just now
when I kiss you
If its only
desire
Or maybe
some love
For slight
it may be
For slight …
See me speak of love
Never even meeting you
But yet even so
I leave to you here
Just two words
To wrap things up
For only words
I can give to you
Aníbal Raposo
1981 |